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Por que a morte é necessária?

Textos de Sri Chinmoy, do livro Morte e Reencarnação


 

mortereencarnacao     Por que a morte é necessária? Por que a alma não pode continuar a progredir e evoluir no mesmo corpo?

 

Por enquanto, morrer é preciso – a morte nos é necessária. Nada podemos fazer por um tempo muito prolongado, de uma vez só. Jogamos durante quarenta e cinco minutos ou uma hora e, então, precisamos descansar. Acontece o mesmo com a nossa aspiração. Suponha que vivamos até os sessenta ou setenta anos na Terra. De sessenta ou setenta anos podemos meditar por vinte ou trinta dias e, mesmo assim, por apenas algumas horas. Um ser humano comum sequer consegue aspirar continuamente por uma hora em sua meditação. Como terá ele a aspiração, a realidade ou a consciência que o levará à Verdade eterna ou à Consciência imortal, todas de uma só vez?

Por enquanto, a morte nos ajuda por um lado – nos permite que descansemos. Quando então retornamos, o fazemos com uma nova esperança, uma nova luz, uma nova aspiração. Mas, se fôssemos dotados de uma aspiração consciente, uma chama ascendente ardendo dentro de nós o tempo todo, veríamos que a morte física pode ser facilmente conquistada. Chegará o dia em que a morte não será necessária. Mas ainda não possuímos tal capacidade; somos fracos. Mestres espirituais, almas libertas, no entanto, possuem domínio sobre a morte, deixando seus corpos quando o Divino assim deseja.

Um homem comum que carregou o peso de uma família toda por vinte, trinta ou quarenta anos dirá: “Estou cansado. Agora preciso descansar.” Para ele, a morte tem significado; a alma entra na região das almas e desfruta de um breve descanso. Mas, para um guerreiro divino, para um buscador da Verdade Última, a morte não tem significado. Ele quer fazer progresso contínuo, sem interrupções. Portanto, tentará viver em eterna, constante aspiração. E com essa eterna aspiração buscará conquistar a morte, para que possa se tornar uma eterna manifestação exterior do Divino que há em seu interior.

 

 

 

Superando o medo da morte através da meditação

 

 

Como podemos vencer o medo da morte?

 

Neste momento você tem medo da morte porque pensa em si mesmo como o corpo, a sua mente, os seus sentidos. Mas chegará o dia em que, pela força de sua aspiração, oração e meditação, pensará em si mesmo não como o corpo, mas sim como a alma. Pensará em si próprio como um instrumento consciente de Deus. E, já que Deus é onipresente, já que Ele o está utilizando para Se manifestar, como poderia Ele, algum dia, abandoná-lo à morte?

Conquistar o medo da morte depende de quanto amor você tem por Deus e quão sinceramente precisa Dele. Se você precisa de alguém, imediatamente estabelece um acesso interior a essa pessoa. Se a sua necessidade de Deus é constante, devotada e plena de alma, então você estabelece no mundo interior um acesso livre ao Amor de Deus, à Compaixão de Deus, ao Cuidado de Deus. E, se pode sempre sentir o Amor, a Compaixão e o Cuidado de Deus, como pode ter medo da morte? Ao sentir que precisa de Deus e que Ele precisa de você, ao sentir Deus dentro de si mesmo, à sua frente e ao seu redor, a morte não mais existe para você. Quando Deus está longe da sua mente, quando não Se encontra dentro de seu coração e não Se encontra em nenhum lugar próximo, nesse momento a morte é real para você. À parte disso, onde há morte? O corpo físico pode deixar a Terra, mas a alma, que é parte consciente de Deus, permanecerá conscientemente em Deus e por Deus, através da Eternidade. É você quem decide pensar em si mesmo como o corpo ou como a alma. Se não aspira e pensa em si mesmo como o corpo, você já está morto na vida espiritual. Mas, se pensa em si mesmo como a alma, isso significa que já desenvolveu uma conexão interior com Deus. Se souber que a alma é a sua verdadeira realidade, você não terá medo algum da morte.

 

     A meditação pode ajudar as pessoas a conquistarem o medo da morte?

 

Certamente. A meditação pode facilmente ajudar o buscador a conquistar o medo da morte. Ela representa comunicação consciente com Deus. Alguém que possa estabelecer sua unicidade com Deus, Aquele que é todo Vida, não terá medo da morte. Conquistará não apenas a morte, mas também algo mais. Conquistará sua dúvida com relação à existência de Deus na sua vida e na vida dos outros. É muito fácil sentir que Deus existe apenas em nós, ou apenas em pessoas espirituais. Todavia, se meditamos, torna-se claro que Deus existe não apenas dentro de nós, mas também dentro de pessoas das quais não gostamos ou não apreciamos.

 

 

 

Vida eterna

 

 

     Você pode dizer algo sobre Eternidade e a Vida Eterna?

 

Sendo um homem espiritual, posso dizer na força de minha própria realização interior que a alma não morre. Sabemos que somos eternos. Viemos de Deus, estamos em Deus, crescemos em Deus e satisfaremos a Deus. Vida e morte são como dois quartos – ir da vida à morte é como ir de um aposento a outro. Onde estou agora é a sala de estar, e aqui estou falando e meditando com vocês, vendo-os. Aqui devo mostrar meu corpo físico; devo trabalhar, ser ativo e expor a minha vida. Contudo, há um outro aposento, o meu quarto. Lá eu descanso e durmo, e não preciso expor a minha existência a ninguém. Estarei por conta própria.

Originamo-nos da Vida Infinita, da Vida Divina. Essa Vida Infinita permanece na Terra por um curto período de tempo, digamos cinquenta ou sessenta anos. Nesse ínterim possuímos em nosso interior a vida terrena. Todavia, dentro dessa vida terrena reside a Vida ilimitada. Depois de um certo tempo, essa Vida novamente passa pelo corredor da morte por cinco, dez, quinze ou vinte anos. Quando entramos nesse corredor, a alma sai do corpo, para um curto ou longo descanso, e retorna para a região da alma. Lá, se a pessoa foi espiritual, a alma retomará a Vida Eterna, a Vida Divina que existia antes do nascimento, que existe entre o nascimento e a morte, que existe na morte e, ao mesmo tempo, vai além da morte.

Agora, enquanto vivemos na Terra, podemos alcançar o reino da Vida Eterna através de nossa aspiração e meditação. Todavia, simplesmente entrando na Vida infindável, não possuiremos essa Vida; temos de crescer nela conscientemente. Quando entramos para a vida de meditação, por fim precisaremos nos tornar parte e parcela da meditação. E, quando formos capazes de meditar vinte e quatro horas por dia, estaremos constantemente vivendo a Vida sem fim. Em nossa consciência interior devemos nos tornar um com a alma. Quando vivemos no corpo, sempre existe morte. No momento em que o medo chega à nossa mente, no momento em que forças negativas chegam à nossa mente, nós morremos de imediato. Quantas vezes ao dia nós morremos! O medo, a dúvida e a ansiedade estão constantemente destruindo nossa existência interior. Mas quando vivemos na alma, não existe morte. O que há é uma constante evolução de nossa consciência, de nossa vida de aspiração.

 

 

O inferno existe?

 

     É o inferno um lugar nos mundos vitais ou é apenas um estado de consciência?

 

No nível físico-mental, o inferno é um lugar, e serve para a experiência da alma. Se você levar uma vida ruim irá para lá, onde existe tortura verdadeira, inimaginável. Principalmente para aqueles que cometeram suicídio, a tortura é infinitamente pior do que ser frito em óleo quente. O sofrimento que os suicidas passam no físico e vital sutis é impensável, intolerável. Não terão uma nova encarnação por um longo período. Após sofrer no mundo vital por muitos anos, quando finalmente encarnam, terão defeitos: cegueira, paralisia, retardo mental e todo o tipo de coisas. E isso não dura apenas uma encarnação. Se não forem perdoados por um Mestre espiritual ou pela Graça de Deus, poderá perdurar por algumas encarnações. Não bastando isso tudo, desde o início eles criam uma perturbação para toda a família em que nascem. Por exemplo, se um suicida encarna sendo insano, trará sérios problemas para toda a família. E essas almas também aumentam o seu karma ruim, pois continuam agindo da mesma maneira, sem mudar. Mas se a Graça de Deus se faz presente, ou se um Mestre espiritual intervém, a alma é auxiliada.

Quando vivemos na consciência física bruta ou na consciência-corpo, o inferno é realmente um lugar. Mas no nível espiritual mais elevado, devemos saber que o inferno, como o Céu, é um plano de consciência. Tanto o Céu quanto o inferno começam na mente. No momento em que pensamos em algo bom, no momento em que oramos e meditamos, e tentamos oferecer a luz interior que recebemos em nossa meditação e oração, começamos a viver no Céu. No momento em que pensamos maldades, criticamos e acalentamos pensamentos ruins sobre alguém, entramos no inferno. Nós criamos o Céu e o inferno. Com os nossos pensamentos divinos criamos o Céu. Com os nossos pensamentos ruins, insensatos, não-divinos, criamos o inferno dentro de nós. Céu e inferno são ambos estados de consciência em nosso interior. Quando buscamos em nosso interior profundo, vemos que o universo inteiro está lá dentro. Dentro deste corpo físico está o corpo sutil e dentro do corpo sutil, no coração, encontramos a presença da alma. E, de lá, se buscarmos ainda mais profundamente, veremos o universo inteiro.

 

 

A alma e a evolução no planeta Terra

 

 

     A alma pode reencarnar em outros mundos após a morte?

 

A alma que entrou em um corpo humano não pode e não reencarna em outros mundos. A alma pode passar através de outros mundos: os envoltórios físico, vital, mental e psíquico. Tão logo a alma deixa o corpo, ela passa através desses planos seguindo até a sua própria região. Mas lá a alma não reencarna. A alma está apenas atravessando esses lugares, os quais são parte da sua jornada de descoberta. Ela visita esses planos, mas não reencarna neles. A alma reencarna apenas no mundo físico, na Terra. Aqui e somente aqui deve a alma manifestar sua divindade.

Existem sete mundos superiores e sete mundos inferiores, e, durante o sono ou a meditação, a alma de todos viaja para essas outras regiões. Ela pode atravessar um mundo após o outro e ir até o mais elevado; ou pode vagar pelas regiões inferiores. Uma pessoa comum não é capaz de sentir os movimentos da alma, mas um grande aspirante espiritual ou um Mestre espiritual pode saber como está a alma e em que plano se localiza. Mas a reencarnação acontece apenas aqui na Terra, neste mundo.

 

 

     Você poderia, por favor, explicar por que a alma evolui apenas no planeta Terra?

 

A alma se manifesta apenas neste planeta porque ele está em evolução. Evolução significa progresso constante, realizações constantes. Quando se quer fazer progresso, quando se quer ir além, então este é o lugar. Nos outros mundos, os deuses cósmicos e outros seres estão satisfeitos com o que já alcançaram. Eles não querem ir sequer um centímetro além do que já alcançaram. Mas aqui na Terra você não está satisfeito, eu não estou satisfeito, ninguém está satisfeito com o que alcançou. Insatisfação não significa que estamos zangados com alguém ou com o mundo, não. Insatisfação significa que temos aspiração constante para ir além e além. Se tivermos apenas uma gota de luz, desejaremos então ter mais luz. Queremos sempre expandir.

Quando a criação iniciou, as almas tomaram caminhos diferentes. Aquelas que buscavam a Verdade derradeira, a Verdade infinita, aceitaram o corpo humano para que um dia pudessem possuir, revelar e manifestar a Verdade aqui na Terra. De acordo com a nossa tradição indiana, existem milhares de deuses cósmicos. Existem tantos deuses e divindades regentes quanto seres humanos. Esses deuses e divindades regentes permanecem nos mundos mais elevados, seja no mundo vital, no mundo intuitivo ou em outro plano elevado. Neste exato momento de acordo com a sua capacidade limitada, eles têm mais poder do que nós. Mas quando estivermos libertos e realizados, completamente unos com a Consciência do Supremo, com a Vontade do Supremo, então transcenderemos a condição deles.

A nossa capacidade humana é infinitamente maior do que a das assim chamadas divindades regentes, porque elas estão satisfeitas, ao passo que nós não estamos satisfeitos com o que temos. Na verdade não é uma questão de insatisfação, mas sim de aspiração constante. Sabemos que o nosso Pai Supremo é infinito. Sentimos que ainda não nos tornamos o Infinito, mas clamamos por expandir e expandir. Este planeta possui tal anseio interior. De um lado, é obscuro, ignorante, e não dá valor à vida divina. Mas por outro lado, tem um anseio interior tremendo, do qual a maioria dos seres humanos ainda não está ciente. Quando o anseio interior atua, então não há fim para as nossas possibilidades, não há fim para as nossas conquistas. E, quando conquistarmos o Infinito, teremos ido adiante das conquistas de outros mundos.

 

 

     É a alma quem determina pelo que passará enquanto estiver no plano da Terra?

 

É a alma quem determina o que ela fará aqui na Terra. Todavia, a nossa mente humana frequentemente faz amizade com a ignorância e a escuridão. Assim, certas almas têm dificuldades, algumas menores e outras maiores. A alma aceitou o destino humano. Se a mente física continua a tomar parte nos desejos mundanos e usufruir as coisas mundanas, naturalmente a alma precisará lutar mais bravamente para se erguer da ignorância. Por algum tempo ela pode ficar completamente encoberta pela ignorância.

Mas, ao mesmo tempo, existem algumas almas que não têm problemas pessoais. São bastante grandes e vastas. Esse tipo de alma poderosa sente que toda a humanidade é sua família. Com toda a sinceridade, ela toma os problemas dos outros sobre si mesma, como se fossem seus próprios problemas. Essas almas são muito graciosas e estão dispostas a aceitar e abrigar o sofrimento de outros. Os grandes Mestres espirituais aceitam as dificuldades da humanidade como se fossem suas. Se quisessem se separar da humanidade, não sofreriam. Mas, aceitando a humanidade, por ela escolhem sofrer, e o fazem muito intensamente. Um ser humano comum que tenta ajudar os outros que estão sofrendo fica preso no sofrimento deles. Já uma alma realizada aceitará a todos e a tudo, todavia sempre inundada de Deleite absoluto. Mesmo enquanto sofre ela sente Deleite interior, porque possui união constante com o Divino, com o Supremo.

 

 

 

Como saber qual a sua encarnação passada

 

 

     Ajudaria sabermos qual tipo de animal fomos nas encarnações passadas ou que tipo de pessoa éramos?

 

Quando entramos para a vida interior e desenvolvemos a nossa consciência interna, a nossa capacidade interior, reminiscências de encarnações passadas acabam vindo à tona. Em nossa meditação profunda, podemos facilmente perceber que tivemos vidas anteriores. E, se sabemos que tivemos um passado, que o presente ainda não está completo, e que nós mesmos não permaneceremos incompletos para sempre, o anseio do presente nos levará para o futuro, onde alcançaremos a nossa plenitude. Ao mesmo tempo, poderemos acelerar o nosso progresso se tivermos um Mestre. Se formos muito dedicados à vida interior e pudermos contar com o Guru, seremos capazes de fazer o progresso de vinte encarnações em uma vida.

Agora, imagine que tomamos conhecimento de que fomos um cervo em nossa última encarnação animal. A única vantagem é que podemos pensar em nossa velocidade e dizer: “Eu corria tão rápido na encarnação animal. E naquela época eu não tinha a alma avançada que tenho agora. Nesta encarnação, eu correrei ainda mais rápido!” Tão logo a lembrança de que corríamos rapidamente em uma encarnação passada nos vem, sentimos inspiração para correr velozmente nesta encarnação. Se conhecermos a nossa encarnação passada, poderemos utilizá-la positivamente, e nessa hora a inspiração vem rapidamente à tona. Se alguém sabe que era um buscador, sente alguma alegria e confiança. “Eu comecei a minha jornada em uma encarnação passada, apesar de ter sido uma estrada muito longa e árdua. Nesta encarnação eu ainda trilho o mesmo caminho, mas desta vez já não tenho mais toda aquela distância a percorrer. Também, será um pouco mais fácil porque eu tenho uma pequena ajuda, tenho a capacidade, tenho a disposição, tenho a experiência. Com um Mestre espiritual guiando-me, alcançarei a minha meta facilmente.”

Todavia, apenas em ocasiões muito raras fazemos bom uso do conhecimento das nossas encarnações passadas. Na maior parte dos casos, estar ciente delas não é nada encorajador. Se soubermos que na encarnação passada fomos ou um ladrão ou algo não-divino, isso nos traria alguma inspiração ou aspiração? Não, e pensaremos imediatamente: “Ó, eu era um ladrão, e nesta encarnação estou tentando me tornar um santo. É impossível! De nada adianta tentar me tornar uma pessoa espiritual nesta vida.” Mesmo quando fazemos algo de errado nesta encarnação, precisamos de um longo tempo para esquecer do desespero, pois argumentamos: “Eu era tão mau. Eu fiz isso. Eu fiz aquilo. Como poderei agora me tornar puro? Como serei capaz de realizar Deus?” Mesmo se tivermos feito algo errado, digamos, quatro anos atrás, aquilo pode ainda nos incomodar.

Imagine que estamos cientes de que em nossa encarnação passada éramos bastante grandiosos e nesta encarnação vemos que não somos ninguém. Nos sentiremos desolados, culpando a Deus e a nós mesmos, dizendo: “Se fui tão grandioso, como é que nesta encarnação eu sou tão imprestável? Que coisa impensável eu fiz para merecer este destino? Deus é tão indiferente; Ele não se importa comigo.” Mas, na verdade, nós não O compreendemos. Através de nós, Deus quer nesta encarnação uma experiência diferente, e pensamos que Ele está sendo cruel.

Um aspirante busca alegria interior, a alegria que verdadeiramente o satisfaz e também a Deus. Isso ele nunca receberá de suas encarnações passadas. Se, mergulhando em uma de suas encarnações passadas, vir que era o presidente dos Estados Unidos, ainda assim não terá satisfação. Verá que, como presidente, a sua vida também era cheia de desolação, frustração e todos os tipos de sofrimento. Pela verdadeira alegria, um aspirante deve seguir em frente na vida espiritual, com a sua própria aspiração e clamor interior, com a sua própria concentração e meditação.

O melhor para nós é simplesmente não pensar no passado. A nossa meta não está atrás de nós, mas sim à nossa frente. A nossa direção é avante, e não para trás. Para uma pessoa espiritual eu sempre digo: “O passado já foi.” Digo isso pois o passado não nos deu aquilo que almejamos. O que desejamos é a Deus-realização. Conhecer as nossas encarnações anteriores não nos ajuda em nossa Deus-realização. Esta depende inteiramente do nosso choro interior. O importante não é o passado, mas sim o presente. Devemos dizer: “Eu não tenho passado. Estou começando aqui e agora, com a Graça de Deus e a minha própria aspiração. Agora começarei a correr. E o quão longe corri no passado é irrelevante. Pensarei apenas em quanto correrei nesta vida.”

Agora vemos o passado como algo completamente diferente do presente, e o presente como algo completamente diferente do futuro. Mas, uma vez que realizamos Deus, o passado, presente e futuro tornam-se um, formando um círculo, o qual é o nosso próprio ser interior, a nossa vida. Nesse momento, poderemos facilmente ver as nossas encarnações anteriores e saber o que fomos.

Se quiser saber sobre as suas encarnações passadas, certamente Deus lhe dará a capacidade. Mas a coisa mais importante não são as encarnações passadas ou futuras, mas, sim, o que você quer aqui e agora. Você quer Deus, e se medita com toda alma, Ele está fadado a conceder-lhe a dádiva. Você O possuirá, e Ele o clamará como Seu.

Desejo dizer uma coisa mais aos meus discípulos. Agora, permitam que eu me vanglorie um pouco, e vocês também podem se gabar um pouquinho. Vocês tiveram vidas espirituais nas encarnações passadas. Se não tivessem algum preparo, acham que Deus os teria trazido até mim? Não, ele os teria levado para algum outro Mestre que fosse um centímetro inferior a mim. Mestres espirituais do meu calibre recebem discípulos que buscaram ou realizaram algo no passado. Alguns fizeram mais, outros menos. Mas todos fizeram algo, senão teriam tido outro Mestre espiritual e não a mim. Deus é bondoso tanto comigo quanto com vocês. Ele não enviará alunos de jardim de infância para o professor de ensino médio. Guardará os alunos de jardim de infância para os professores que não podem ministrar aulas mais avançadas. Em raras ocasiões, um ou dois discípulos vêm até mim após algumas poucas encarnações humanas, mas essas poucas almas têm um desejo intenso de transcender a sua presente consciência.

 

 

     Caso alguém seja um buscador bastante avançado e desenvolva a capacidade de ver as suas encarnações passadas, isso irá, na verdade, dificultar o seu progresso? Em outras palavras, é sempre ruim se um buscador descobrir que foi um ladrão ou algo assim no passado?

 

Se você medita o mais sinceramente nesta vida, a sua força interior irá automaticamente se desenvolver, e você alcançará o ponto onde não será perturbado mesmo se descobrir que era o pior criminoso em uma encarnação anterior. Sabe que veio aqui para se transformar, para ir em direção ao Divino. O Senhor Buddha revelou todas as suas encarnações anteriores: ele foi um cabrito e muitas outras coisas. Mas, porque tinha realizado Deus e alcançado a Verdade altíssima, foi fácil para ele dizer o que foi em nascimentos anteriores. Era irrelevante o fato de ele ter sido bastante mundano em suas encarnações anteriores.

 

 

     Se um homem morre e possui muita estima e compaixão por um cão ou outro animal, isso fará com que reencarne como um animal também? Soube de uma história em que, na Índia, algo aconteceu a um cordeirinho enquanto um grande sábio estava meditando. O sábio tomou conta do cordeiro e ficou bastante afeiçoado, o que fez com que se tornasse também um cordeiro em sua próxima encarnação.

 

A maior escritura da Índia e também a mais extensa no mundo é chamada Mahabharata. No Mahabharata existe um bom número de histórias em que um ser humano mais tarde reencarna como animal. Existe uma história famosa sobre um rei chamado Bharata, que tinha muito apreço por um cervo, e que supostamente se tornou um cervo em sua encarnação posterior. Ramakrishna, o grande Mestre espiritual, demonstrava muito afeto a Swami Vivekananda, o seu mais querido discípulo. Ele costumava procurar o discípulo para falar com ele, e as pessoas achavam que Ramakrishna era louco. Um dia Vivekananda disse a ele: “O que você está fazendo? Não conhece a história do Rei Bharata, que, de tão apegado ao seu cervo, tornou-se um cervo em sua próxima encarnação? A sua sorte será a mesma que a dele, se pensar constantemente em um ser humano comum como eu.” Ramakrishna levou o que Vivekananda disse a sério e perguntou à Mãe Kali: “É verdade que o meu destino será similar ao do Rei Bharata?” Ela disse: “Isso é besteira! Você gosta de Naren [Vivekananda] porque vê Deus nele. Não é porque ele é belo ou algo assim. Não, você gosta dele porque a manifestação de Deus é expressa nele. Por isso fica tão feliz em vê-lo.”

Portanto, se demonstrar compaixão a alguém, isso não significa que se tornará aquela pessoa. Se um pedinte pede esmola e você demonstra a sua profunda compaixão por ele e lhe dá dinheiro ou comida, isso não quer dizer que você mesmo se tornará um pedinte. De maneira similar, se tiver um cão, você pode demonstrar o seu amor pelo cão, porque ele é extremamente leal a você e por outras coisas. Mas isso não implica que você se tornará um cão por admirar as qualidades do seu amado cão. As boas qualidades, a lealdade do cão, você pode, sim, possuir em sua existência humana, mas sem viver uma vida animal. Simplesmente por demonstrar apego a um animal, você não se tornará um animal, pois já passou por aquele estágio. O que se aproveita são as boas qualidades do animal.

 

 

     É possível para um indivíduo se lembrar de detalhes das suas encarnações passadas?

 

A alma pode facilmente lembrar-se de suas encarnações passadas, mas não deseja fazê-lo. Digamos que em uma encarnação passada você estava vivendo em Connecticut e agora está vivendo em Porto Rico. Por que deveria lembrar-se diariamente de como era a sua casa em Connecticut ou quantos quartos havia lá? O seu dever agora é ficar em Porto Rico, na sua casa atual. Se alguém perguntar onde você vive, você dirá: “Eu vivo em Porto Rico.” E se alguém perguntar o número de quartos da sua casa, imediatamente pensará nessa casa e não na sua casa anterior.

Por favor, não dê atenção alguma ao passado. Agora você deve fazer o seu próprio trabalho. Deve manifestar as qualidades que Deus lhe concedeu. Você tem de fazer tudo aqui e agora. A alma não se importa muito com o corpo em que viveu numa encarnação anterior. Ela pode se lembrar que em uma encarnação passada as circunstâncias, o ambiente e as oportunidades eram melhores. Mas a alma não se importa. Ela quer apenas satisfazer a Deus à maneira própria Dele.

Você aceitou o seu destino. Trabalhará e estudará aqui em Porto Rico. A alma também se sente assim. Ela diz: “Agora estou neste corpo. Deixe-me manifestar o quanto eu puder. Pensar sobre o que eu poderia ter feito no passado não resolverá os meus problemas. Apenas o que farei agora poderá solucionar todos os meus problemas.”

Caminhar em sentido contrário seria uma perda de tempo. A nossa meta está à nossa frente, e não atrás de nós. A alma não se importa nem um pouco com o passado. Ela deseja apenas alcançar a meta. A Deus-realização se encontra à nossa frente, e não em nosso passado. Se caminharmos para trás, estaremos desperdiçando o nosso tempo.

 

 

     Todas as almas passam por centenas ou milhares de encarnações antes da realização?

 

Sim, apenas Mestres espirituais não passam por tantas encarnações. Existem algumas exceções entre os Mestres espirituais, mas a maioria deles não deseja passar por tantas encarnações.

 

 

 

 

Suicídio

 

 

Às vezes, as pessoas suicidam-se ateando fogo em si mesmas como protesto contra a guerra. Do ponto de vista espiritual, o que se ganha com isso?

 

Em uma família, frequentemente os irmãos lutam entre si. Então a mãe diz: “Se vocês não pararem, eu cometerei suicídio.” Conheço muitos casos onde os pais cometeram suicídio quando sentiram que era impossível manter a harmonia na família. Os filhos mudam imediatamente. Ao ver que seus pais morreram por causa das suas brigas, começam uma nova página na vida. Mas isso não dura, e logo estão os irmãos brigando novamente.

Do ponto de vista espiritual, o suicídio não serve a propósito algum. A mãe se sacrificou por seus filhos. Através de seu próprio sacrifício físico ela achava que criaria harmonia, mas no mundo vital não há escapatória, não há perdão para ela. Ela irá para o mundo vital pela sua tolice, e lá ficará. Por que ela não teve a sabedoria de ver que seus filhos não são seus filhos, mas filhos de Deus? Se Deus deu a ela esses filhos, então por que ela não buscou Deus, para que iluminasse a consciência deles? Por que não orou a Deus pela sua harmonia e paz?

O mundo permanecerá ignorante a não ser e até que o Supremo ilumine a consciência mundial. Se sacrificarmos nossas próprias vidas para trazer paz, os problemas do mundo nunca serão solucionados.

Muitos mártires, aspirantes e personalidades espirituais cometeram suicídio, mas aquilo não resolveu os problemas do mundo. Tais problemas se resolverão apenas através da aspiração, ao orar a Deus pela iluminação do mundo, enquanto estamos na Terra. Nossa morte nunca transformará a face do mundo. Mas se invocarmos a Bênção de Deus, a Graça e o Cuidado de Deus, o problema poderá ser solucionado.

 

 

     É o inferno um lugar nos mundos vitais ou é apenas um estado de consciência?

 

No nível físico-mental, o inferno é um lugar, e serve para a experiência da alma. Se você levar uma vida ruim irá para lá, onde existe tortura verdadeira, inimaginável. Principalmente para aqueles que cometeram suicídio, a tortura é infinitamente pior do que ser frito em óleo quente. O sofrimento que os suicidas passam no físico e vital sutis é impensável, intolerável. Não terão uma nova encarnação por um longo período. Após sofrer no mundo vital por muitos anos, quando finalmente encarnam, terão defeitos: cegueira, paralisia, retardo mental e todo o tipo de coisas. E isso não dura apenas uma encarnação. Se não forem perdoados por um Mestre espiritual ou pela Graça de Deus, poderá perdurar por algumas encarnações. Não bastando isso tudo, desde o início eles criam uma perturbação para toda a família em que nascem. Por exemplo, se um suicida encarna sendo insano, trará sérios problemas para toda a família. E essas almas também aumentam o seu karma ruim, pois continuam agindo da mesma maneira, sem mudar. Mas se a Graça de Deus se faz presente, ou se um Mestre espiritual intervém, a alma é auxiliada.

Quando vivemos na consciência física bruta ou na consciência-corpo, o inferno é realmente um lugar. Mas no nível espiritual mais elevado, devemos saber que o inferno, como o Céu, é um plano de consciência. Tanto o Céu quanto o inferno começam na mente. No momento em que pensamos em algo bom, no momento em que oramos e meditamos, e tentamos oferecer a luz interior que recebemos em nossa meditação e oração, começamos a viver no Céu. No momento em que pensamos maldades, criticamos e acalentamos pensamentos ruins sobre alguém, entramos no inferno. Nós criamos o Céu e o inferno. Com os nossos pensamentos divinos criamos o Céu. Com os nossos pensamentos ruins, insensatos, não-divinos, criamos o inferno dentro de nós. Céu e inferno são ambos estados de consciência em nosso interior. Quando buscamos em nosso interior profundo, vemos que o universo inteiro está lá dentro. Dentro deste corpo físico está o corpo sutil e dentro do corpo sutil, no coração, encontramos a presença da alma. E, de lá, se buscarmos ainda mais profundamente, veremos o universo inteiro.

 

 

     Se alguém morre de maneira violenta, a sua alma é submetida ao mesmo sofrimento a que é submetida a alma de alguém que comete suicídio?

 

Não, não é o mesmo. Se alguém se torna vítima de guerra ou se morre violentamente em um acidente de carro, é porque algumas forças ruins a levaram. No entanto, se alguém destrói o próprio corpo, ele se torna o agressor. Portanto, vítima e agressor não podem ser colocados na mesma categoria.

 

 

     Mas e se um prisioneiro político comete suicídio para acabar com o insuportável sofrimento? Essa pessoa teria o mesmo tipo de punição que alguém teria ao tirar a própria vida como um capricho de escapismo?

 

Depende dos méritos e deméritos. Durante a guerra, quão desumana e brutalmente as pessoas nos campos de concentração foram torturadas e mortas. Mas, e se eles mesmos tiraram suas próprias vidas porque não queriam ser mortos ou surrados sem motivo? Saibamos que existe algo chamado isenção de Deus. Digamos que essas pessoas são inocentes e estão sendo mortas. Para que não sejam mortas pelo inimigo, elas podem desejar tirar suas próprias vidas.

Na Índia e também em outros lugares ocorreram muitos casos onde dois guerreiros estão lutando e um deles sabe que o outro certamente já venceu, sendo uma questão de minutos ou segundos até que seja destruído ou derrotado. Este imediatamente dará um fim à sua vida. O seu sofrimento não seria o mesmo caso houvesse simplesmente cometido suicídio.

 

 

     A alma sofrerá se uma pessoa cometer hara-kiri, uma forma de suicídio considerada honrada no Japão?

 

Depende da particularidade de cada caso. Normalmente, as pessoas cometem suicídio porque não conseguem encarar a realidade; elas têm problemas emocionais ou os seus desejos não são satisfeitos. Mas cada caso é diferente e apenas Deus pode decidir. No caso de Mestres espirituais, estes podem deixar o corpo quando quiserem. Mas eles não ferem o físico. A alma sai de maneira ocultista e espiritual. Mas primeiro eles devem ter a permissão do Supremo.

 

 

     Se alguém tenta algo quase impossível para salvar a vida de outra pessoa e morre nessa tentativa, seria como suicídio?

 

Deve-se saber o motivo. A mãe que vê o filho se afogando pode não saber que a intenção de Deus é que ela permaneça na Terra e cuide de seus outros filhos. Ela vê apenas que seu filho está se afogando e então tenta salvá-lo. Caso ela morra, isso não seria suicídio.

 

     A sua filosofia afirma que a alma está sempre fazendo progresso, mas como você concilia isso com o fato de que quando alguém comete suicídio a sua alma cai?

 

Quando se comete suicídio a alma da pessoa na verdade não cai. Mas permanece em um certo lugar e é encoberta por infinitos mais véus de ignorância. É a consciência do indivíduo que cai, retornando ao ponto de partida, quase até à consciência mineral, onde não há evolução. A alma fica eclipsada por abundante ignorância, isto quer dizer, infinitas camadas de ignorância. Antes, talvez a alma tivesse dez camadas, mas agora possui incontáveis camadas de ignorância. Ela deve começar tudo novamente, removendo-as uma a uma. É claro, fica infinitamente mais difícil para a alma levar o indivíduo à perfeita perfeição, libertação ou salvação.

Mas se o Supremo quiser agir em um ser humano em particular, o qual cometeu suicídio, em ocasiões muito, muito raras, o Supremo pede aos Mestres espirituais, os quais possuem a capacidade, que cuidem daquela alma e que não permitam que ela seja envolvida por tão vasta ignorância. Nesses casos, o que quer que a alma já possua é suficiente para trazer a Graça e Compaixão do Supremo, e Ele não permitirá que um véu a cubra mais do que o habitual. Entretanto, isso é feito somente em ocasiões muito raras.

De outra forma, se alguém comete suicídio, a evolução pára indefinidamente para ele – por cem, duzentos, quinhentos, seiscentos anos ou mais. Ele não consegue ir adiante, e a carga mais pesada é colocada em seus ombros. O processo de evolução pára. Por ter violado as leis do Jogo Cósmico, ele deve se submeter à punição cósmica. Essa punição não pode nunca ser concebida por qualquer ser humano na Terra. A pior tortura terrena não é nada quando comparada com a punição cósmica que o indivíduo recebe quando comete suicídio.

Você não pode dizer às forças cósmicas: “Eu fiz algo errado, mas não é da sua conta. Alcançarei a minha meta apenas quando tiver vontade.” Você saiu do Jogo Cósmico intencionalmente, sem a permissão de Deus e contra a Sua intenção. Ele não permitiu que você deixasse o jogo, mas ativa e abertamente você O contrariou e tentou arruinar o jogo. Para essa má ação, a punição é das mais severas, tão intensa que não podemos senti-la com o nosso coração humano, e somos incapazes de imaginá-la com a nossa mente humana.

 

 

 

 

Cremação e enterro

 

 

 

 

     Qual a diferença entre a cremação e um enterro comum?

 

A diferença exterior você sabe: quando há cremação, o corpo é queimado; quando há enterro, o corpo é colocado num esquife e enterrado. Particularmente adoradores do fogo são os indianos. Sentem que o fogo não só consome tudo, mas também purifica tudo. Portanto, para o fogo nós temos um deus, cujo nome é Agni. Oramos a Agni por purificação e auto-conhecimento, e também entregamos nossos mortos a ele.

Do ponto de vista espiritual, sabemos que o corpo veio a existir a partir de cinco elementos: terra, água, ar, éter e energia. Dos cinco elementos a casca material veio à existência, e com a ajuda do fogo ela retorna aos cinco elementos. Com a cremação, o corpo físico se dissolverá em purificação absoluta, que aqui significa transformação.

Mas, no Ocidente, aqueles que preferem o enterro também têm sua interpretação espiritual. Surge uma espécie de compaixão espiritual, pois o corpo nos serviu tão fielmente, e então dizemos: “Oh!, eu utilizei este corpo por tantos anos e nunca dei descanso a ele. Agora a alma não está mais lá; o pássaro voou. Deixe-me dar uma chance de descanso ao corpo, colocando-o num esquife.” Os que preferem queimar o corpo sentem que ele, que fez tantas coisas tolas e más na vida, precisa de purificação. E aqueles que dão importância ao enterro querem proporcionar ao corpo um descanso confortável.